O
PAPEL SOCIAL DO PROFESSOR DE HISTÓRIA NA EJA
Parto das reflexões do pedagogo canadense Maurice Tardif (2001: 113) de que os “professores de profissão possuem saberes específicos que
são mobilizados, utilizados e produzidos por eles no âmbito de suas tarefas
cotidianas”.E compreendendo que este saber escolar se constrói no diálogo com o
código disciplinar (CUESTA FERNANDES,
1997:9-27), tanto como uma tradição
discursiva e reguladora, como o curriculum (oculto e declarado), optamos
por realizar uma observação teórica autorreflexiva das práticas docentes no Centro
Integrado de Educação de Jovens e Adultos Campo Limpo (CIEJA CL), instituição onde as práticas educativas
se estruturam pela autonomia dos educandos e pela metodologia investigativa
interdisciplinar construída coletivamente.
Por conseguinte, o
marco teórico desta observação é a síntese realizada pela professora Maria
Auxiliadora Schmidt (2005:43) que explicita a “construção do código disciplinar
da História” baseada nas reflexões do sociólogo R. Cuesta Fernandez, de que os
textos invisíveis e os visíveis deste código, assim como sua relação com a
construção do Estado Nacional está intimamente relacionada a chamada “crise” na
Educação. Esta “crise” é mais geral e diz respeito a dificuldade de encontrar
sentido no ato de “testemunhar” para as próximas gerações a construção do
conhecimento acumulado pela humanidade ao longo do tempo.
Uma saída apresentada
pela autora para esta “crise” é a ideia de W. Benjamin da “teoria do perigo”,
onde devemos sempre estar atentos para tirarmos da “tradição” a força para
renovar as práticas e não ratificá-las no “conformismo”. E no âmbito do ensino
de História, as práticas escolares deveriam seguir os caminhos propostos por
Paulo Freire atuando na dinâmica da autonomia dos educandos e J. Rüsen no
desenvolver de uma consciência histórica crítica-genética. (RÜSEN, 2001: 73)
Deste modo, as
observações aqui colocadas fazem parte de um autorreflexão como prática docente
(POPKEWITZ, 1997:89-109), no sentido de uma “pesquisa-ação” que se (re)avalia
constantemente e modifica sua prática a partir da reflexão.
CIEJA CAMPO LIMPO: um espaço diferenciado de
Educação de Jovens e Adultos
”Ao
contrário, quando as resistências às
mudanças triunfam, no momento em que as esperanças são frustradas, em que a
desilusão se enraíza, assiste-se à recusa da racionalização global do real. Já que o real não
realiza as esperanças, ele não pode ser
racional. A história perde, então, todo sentido, fragmenta-se em múltiplos segmentos. O real só é, portanto,
racional quando o homem o assume.
Perde essa racionalidade quando escapa à vontade humana.“ (DOSSE,
2005: 73)
A História é também narrativa, e portanto, um pesquisador/historiador também produz uma narrativa (sempre parcial) mesmo quando trabalha com relatos próprios, ou mesmo com um uma análise sociológica. Talvez seja um de suas maiores valores – construir narrativas – mas seu maior desafio é que estas narrativas sejam coerentes. Assim, passamos a construir uma narrativa das observações realizadas no CIEJA CAMPO LIMPO, elencando, na medida do possível, algumas questões relevantes para a pesquisa no Ensino de História, tais como práticas de ensino e aprendizagem histórica.
Destarte,
propomos uma análise autorreflexiva de pesquisa-ação (MORRIN,
2004), onde o pesquisador deve se implicar como agente da
pesquisa, não somente como observador e compreendendo que as ações são feitas
por atores, espaços e instituições concretos com seus dinamismos próprios e com
objetivos negociados. Assim, passamos a construir uma narrativa em primeira
pessoa, como não poderia deixar de ser, já que o pesquisador também é o professor
do CIEJA Campo Limpo e, portanto, atravessado pela sua subjetividade e pela
autorreflexão proposta por Morin tentará dar sentido a uma experiência
educativa concreta realizada durante o primeiro semestre do ano de 2018.
Autorreflexão como prática docente
“Palavras sem obras são tiros sem balas; atroam,
mas não ferem. O pregar que é falar faz-se com a boca; o pregar que é semear
faz-se com a mão. Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração
são necessárias obras.” (António
Vieira, 1993: 605)
O CIEJA CL se
diferencia dos demais espaços de promoção da Educação de Jovens e Adultos da
Prefeitura de São Paulo por sua estrutura curricular, organização e
arquitetura. O Centro Integrado tem sua sede atual em um antigo casarão
incrustado no Parque Maria Helena, bairro da Zona Sul de São Paulo, e logo na
entrada há uma faixa com os seguintes dizeres: “Que bom que você está aqui!”.
Uma das características deste espaço educativo é o acolhimento como um
dos valores primordiais (tanto que nomeia o primeiro agrupamento de ciclo I –
Alfabetização).
O CIEJA CL também se diferencia por ser um espaço
exclusivamente da modalidade de Educação de Jovens e Adultos, e como tal, pode
arriscar experimentar e construir uma educação transformadora fora dos modelos
tradicionais. Podemos citar várias práticas que tornam o CIEJA CL um espaço
privilegiado de troca de saberes entre educadores e educandos, mas devido aos
limites deste trabalho ficaremos só no relato da estrutura física e na prática
didática promovida neste espaço.
A estrutura arquitetônica é composta por um
casarão de três andares alugado pela Prefeitura de São Paulo do governo alemão
e um segundo sobrado adaptado recentemente adquirido de uma clínica médica
falida, mas o que é mais interessante é como os cômodos do casarão se tornaram
espaços educativos convidativos com mesas sextavadas (onde os educandos
compartem suas trajetórias de aprendizagem e constroem um aprendizado
colaborativo. Além disto, o CIEJA trabalha com EJA modular por áreas de conhecimento,
isto é, os educandos passam um mês em cada área de conhecimento (Ciências
Humanas, Linguagens e Códigos, Pensamento Ético-científico e Matemáticas),
estas áreas por suas vezes sempre são trabalhadas por dois professores com
formações distintas (no caso de Ciências Humanas, a dupla docência se dá por um
professor de História e um de Geografia ou Sociologia).
Deste modo, no que diz respeito a metodologia
construída cotidianamente no CIEJA CL temos como base a construção da autonomia
discente diante do aprendizagem formal, pois todos os nossos educandos são
jovens e adultos portadores de saberes, que podem ter interrompido ou mesmo
nunca ter tido contato com o conhecimento formal, mas construíram uma sabedoria
própria durante suas vidas, como explicitava Paulo Freire (1996) e que a educação de Jovens e
Adultos sempre deve levar isto em conta.
Passamos a relatar e analisar a trajetória de um
agrupamento especifico, como exemplo da prática docente no CIEJA CL. Os
educandos da turma Alegria eram, em sua maioria, alfabéticos, e a maior parte
deles tinha leitura fluente. Contudo a turma Alegria apresentava dificuldade na
compreensão do conteúdo abordado nos textos, sendo assim, parte deles apenas
conseguia localizar as informações dos textos. A equipe de Ciências Humanas
identificou dificuldades também em relação à escrita. Parte desses educandos
consegue produzir pequenos textos argumentativos (ainda que com muitos
problemas nas convenções da língua portuguesa), porém muitas vezes reforçam o
senso comum e reproduzem preconceitos. A maior parte da turma de Alegria não
adquiriu ainda a habilidade de transpor para o texto o que consegue expor na
oralidade, tendo realizado discussões complexas e enriquecedoras em sala, mas
não conseguindo registrá-las no papel.
Objetivos
das Atividades realizadas na área de Ciências Humanas
Conforme o planejamento da área de Ciências Humanas,
procuramos desenvolver as aulas de modo a relacionar o tema da violência contra
as mulheres e a constituição da saúde como um direito, de forma a contemplar
dois dos temas mais votados pelos educandos no incio do ano letivo, na fase da
escolha do tema gerador, onde as escolhas são resultado de um exercício
democrático e de construção de autonomia no CIEJA CL. Selecionamos os assuntos
e temas a serem discutidos de acordo com a movimentação da constituição das
políticas públicas relacionadas à saúde e a luta contra a violência às
mulheres. Assim, no desenvolvimento das aulas evidenciou-se que esses são temas
que, de fato os atingem diretamente, visto que os educandos fizeram muitos relatos de terem sofrido ou
presenciado alguma forma de violência contra a mulher ou ter sido vitimada em
situações de descaso com a saúde pública.
Iniciamos o tema apresentando a
situação-problema, elaborado pela equipe de Ciências Humanas e que abordou a
mesma problemática, mas que
a depender de quem lê (no que tange às diferenças
de gênero), aparece de forma distinta a partir do papel social que o leitor
ocupa:
“Maria sempre viveu um histórico de violência na
família: seu pai batia constantemente na sua mãe e os irmãos homens sempre
tiveram privilégios (não precisavam fazer as tarefas domésticas). Ela conhece
um rapaz, José, e sonha em formar uma família diferente da sua com ele. E José
é um adolescente que busca ajudar sua família que passa por muitas
dificuldades. É usuário de drogas e sua família o inscreveu para participar de
um retiro na igreja, que foi o lugar onde se conheceram. Começaram a namorar
escondidos. Logo Maria fica grávida e conta para José. Este diz que o problema
é dela, que não se cuidou. Fica irritado e bate violentamente nela e a obriga a
fazer o aborto. Com medo de contar para a família, que é muito religiosa, Maria
entra em desespero. Machucada tenta procurar atendimento no SUS e não consegue.
Por outro lado, a família de José quer que ele se trate em um lugar longe das
drogas, mandando-o para casa de parentes no interior.”
Após a leitura da situação-problema foram
levantadas as seguintes perguntas: NOSSAS IDEIAS - Se você estivesse
nesta situação de Maria e de José, o que você faria? O que você faria com
relação aos problemas enfrentados: saúde, aborto, família e violência?
Na elaboração das ideias e na construção dos
textos, os alunos em sua quase totalidade disseram serem contrários ao aborto.
Todos disseram que mesmo o homem sendo o agressor, ou um usuário de drogas, a
mulher deveria seguir em frente com a gestação, mesmo sozinha. Mostrando como
os papeis sociais dos gêneros e o machismo se reproduz no senso comum. Assim
sendo, começamos a trabalhar a desconstrução dos locais cristalizados das
mulheres na sociedade ratificadas pelo machismo estrutural.
Para tanto, iniciamos várias discussões com
frases de autoras que questionavam os papeis preestabelecido das mulheres na
sociedade. Assim a frase do dia da escritora Pauline Chiziane: “Sou
mulher e sou preta, então, tudo que faço tem que ter erros. Se não tiver,
arranjam”, apareceram frases extremamente machistas sobre a mulher. E para
desconstruir essas ideias fizemos um trabalho sobre respeito e a desumanização
das mulheres na propaganda e na sociedade como um todo para compreender o porquê
do tratamento desigual que é dado à mulher. A discussão ficou bastante
acalorada principalmente com os adolescentes que trouxeram outros problemas
como o comportamento e as roupas das meninas tanto na rua como nos bailes funk.
Como fica claro nas seguintes frases registradas no dia: “mulher de respeito é
trabalhadeira”; “é a que cuida da família”; “é a que tem postura, não mexe com
outros homens”; “é a que se veste direitinho”; “é a que não vai pro Pancadão”.
Levando em
consideração esta discussão elaboramos uma atividade para (re)pensar o
paradigma de “mulher de respeito” apresentado pelos educandos e construir uma
consciência de que toda a mulher merece respeito independente de como age ou se
veste. Assim, propomos aos educandos discutirem a letra de um RAP do cantor
Brunno Mello Roupa não é caráter e fizeram a construção de frases e
colagem num painel com o título: “Minha roupa não te dá o direito de:”.
Fig. 1
Painel com as frases
feitas pelos educandos sobre a roupa da mulher
A discussão se estendeu com documentários curtos
sobre a questão da mulher como objeto e aproveitamos a campanha da Jornalista Nana Queiros – “Não mereço ser estuprada”,
sobre a denuncia de violência e abuso contra a mulher para questionar ideias
machistas apresentadas no inicio das atividades.
(QUEIROS,
2018)
Depois
das discussões sobre a temática os educandos tiveram uma mudança de postura nos
discursos em sala de aula e alguns adolescentes disseram que conseguiram
entender o papel da mulher e que mudou o comportamento dele de achar que tinha
direito de passar a mão nas meninas que estivessem usando roupas curtas.
Por
conseguinte, sentimos a necessidade de trazer um texto jornalístico abordando a
questão da violência contra as mulheres, enfatizando a construção do conceito
de feminicídio, inclusive, colocando a pesquisa do termo como atividade
extraclasse. Em nossas discussões, enfatizamos que dentre o recorte de exclusão
de gênero, se houver também o recorte racial, as mulheres negras sofrem a
exclusão duas vezes.
Em
seguida, trabalhamos as características
do texto jornalístico, destacando com eles as partes que compõem o jornal e a
reportagem (manchete, olho da notícia, lide e o corpo da notícia) e, como os
alunos apresentaram bastante dificuldade em relação à localização desses
elementos, construímos a construção do quadro de identificação dos itens
componentes da reportagem coletivamente, e proporcionamos momentos que os
estudantes fizessem exercício de leitura e compreensão do texto, também de
forma coletiva.
Para
explicar que a questão da violência contra as mulheres está relacionada à saúde
pública, selecionamos um texto que trazia dados sobre os custos necessários ao
tratamento das mulheres vitimadas pela violência doméstica, problematizando com
os estudantes que, se não houvesse violência doméstica, os recursos poderiam
ter outras finalidades.
Para
enriquecer o debate, assistimos vídeos variados sobre o assunto, em diferentes
linguagens, como trechos de documentários, entrevistas, filmes, dentre outros,
para que se apropriem também da linguagem audiovisual como recurso de
aprendizagem (NAPOLITANO, 2003).
Retomamos
a questão da dominação e violência contra a mulher durante a história do
Brasil, explicando que as raízes dessa questão encontram-se na estrutura
familiar estabelecida durante o período colonial, e que inicialmente, a
miscigenação era uma questão importante, visto que as mulheres indígenas e
negras eram vistas como objetos sexuais, iniciando aqui a objetificação do
corpo da mulher dado por um recorte étnico – racial. (COUTINHO, 1994)
Para a
construção dessa situação de aprendizagem, elaboramos junto com os educandos uma linha do tempo, no primeiro momento da vida
deles, e depois, da história do Brasil. Foi construída também uma linha do
tempo da saúde no Brasil. Nessa atividade identificamos que muitos dos
educandos da turma de Alegria não têm domínio da construção numérica, o que
dificultou a compreensão da sequência histórico temporal dos assuntos que
propusemos.
Nesta turma demos preferência para destacar a
história e importância do SUS e a questão da violência contra a mulher. Deste
modo, as apresentações finais os alunos destacaram a violência contra a mulher
a partir da Campanha feita pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), “Isso tem nome: Feminicídio”, que trata de
mortes violentas de mulheres por uma única razão – ser mulher. Com peças de
certidões de óbito estilizadas, o TJSP traz nomes fictícios e tipos de mortes
reais mais comuns, como por estrangulamento, facadas, tiros e agressões.
Caixão usado na apresentação com a certidão de
óbito das mulheres vítimas de feminicídio.
Conclusão
Transcorrido o sitius
de disputa entre “uma narrativa escolar”, um lócus analítico e as
observações das práticas cotidianas de ensino das aulas no CIEJA CL cabe dizer algumas palavras a guisa de conclusão.
O primeiro que deve ser dito é que está é uma conclusão parcial, já que a
proposta de pesquisa-ação é sempre reelaborar as ações a partir da
autorreflexão e reaplicação.
Por conseguinte, podemos avaliar a experiência de
autorreflexão, metodológica e epistemológica de grande monta para um jovem
professor de história que busca repensar coletivamente suas práticas didáticas,
buscando compreender o papel social do professor de história.
As
discussões sobre o papel social do historiador ajudam a compreender como se dá o ensino de história numa
situação concreta, quais forças discursivas estão em jogo e quais caminhos os professores escolhem seguir. Assim, sem
a observação crítica do cotidiano é impossível vencer as amarras das práticas
tradicionais e mais fáceis de se perpetuarem. Porém, sem reconhecer que estas
práticas fazem algum sentido no código disciplinar e nas representações da
própria disciplina de História, perante os estudantes e a sociedade em geral,
não seremos capazes de romper estereótipos para com o saber histórico.
Por fim, reconhecer a importância do ensino de
história, da elaboração de boas questões, socialmente
significativas, para usar os termos de Tutiaux-Guillon (2001:15-37) como as problemáticas
de gênero apresentadas neste relato, no sentido de que os problemas do presente
iluminem os estudos do passado
Mas também, a
pesquisa histórica como ferramenta fundamental para o ensino de História
ultrapassar explicações estereotipadas do passado, ou mesmo tautológicas ou
teleológicas, e, alcançar uma empatia histórica, que incorpore o contexto
material em sua compreensão do passado. Por isto, buscou-se ultrapassar os déficits
de uma História distante (geograficamente ou conceitualmente), congelada como
narrativa tradicional, trazendo os estudantes para o campo de pesquisa e
transferindo a responsabilidade do saber para o campo da ação social.
Os professores devem atuar como mediadores
culturais (NACIF XAVIER, 2017: 464-485) entre os saberes socialmente constituídos pelos educandos e os saberes
acadêmicos desenvolvidos no âmbito das Ciências Humanas (em especial da
historiografia). A mudança de comportamento dos jovens machistas, pelo menos em
suas falas, indicam que a educação como mecanismo de autonomia e consciência é
possível. Mesmo que as adversidades pareçam como montanhas intransponíveis, os
rios da autorreflexão cavam seus caminhos.
Referências
Rubens Baldini Neto é professor efetivo da
Prefeitura de São Paulo e designado como professor de Ciências Humanas no CIEJA
CL. Mestrando do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de História
(IFCH-UNICAMP) com orientação acadêmica da Prof.ª Drª. Cristina Meneguello.
COUTINHO, Maria Lúcia Rocha. Tecendo por
Trás dos Panos - a mulher brasileira
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como disciplina escolar. In: Sociogénesis de una disciplina escolar: la História. Barcelona (Es).
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1997.
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia:
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HARTOG, François.
Regimes de historicidade: presentismo e experiência do tempo. Trad. de Andréa S. de Menezes, Bruna Breffart, Camila
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RÜSEN, J. A
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XAVIER, L. N. . Interfaces entre a história
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Muito interessante o seu trabalho e o da escola! Gostaria de saber mais a respeito do Cieja-CL e também fiquei curiosa sobre a receptividade dos alunos na escola. Você poderia falar um pouco mais?
ResponderExcluirAbraço.
Raylla Dias Miranda
O CENTRO INTEGRADO DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO CAMPO LIMPO completou 21 anos de experiência transformadora na EJA, com reconhecimento pela UNESCO de Escola de Referência em EJA.
ExcluirPara conhecer mais sobre o projeto recomendo o blog oficial da Instituição e o site do Projeto "Escolas Transformadoras" .
Aproveito para convidá-la a conhecer a escola municipal que fica no Capão Redondo periferia de São Paulo. Dia 06 de junho de 2019 teremos o VII Encontro Indígena do CIEJA CL com a presença de lídranças indígenas de várias etnias compartilhando saberes com nossos educandos, uma oportunidade muito legal para conhecer o projeto.
Atentamente,
Rubens Baldini Neto (ProfHistória-UNICAMP)
Boa noite, caros Rubens Baldini!
ResponderExcluirInteressante o seu trabalho, minha primeira experiência docente foi com alunos da educação de Jovens e adultos ( EJA), no Programa Brasil Alfabetizado. Foi algo muito enriquecedor, no entanto, havia muitas dificuldades relacionadas ao trabalho, já que assim como os Educandos da turma ALegria, a maioria dos alunos apresentavam dificuldades de leitura e interpretação, e não dispunham de um ambiente adequado para realizar seus estudos, porém traziam com eles as vivências, ou seja, suas "sabedorias próprias". Além da questão do SUS, que outras temáticas foram trabalhado por vocês durante essa experiência?
Atenciosamente: JOÃO PAULO DE OLIVEIRA FARIAS
Boa tarde estimado João Farias,
ExcluirNo CIEJA CAMPO LIMPO temos como base o pensamento de Paulo Freire e como tal elaboramos na primeira semana de aula uma série de “Sensibilizações” com todos os agrupamentos no sentido de exporem o que interessa a eles estudarem durante o ano. Assim, os temas são eleitos em Assembléias Gerais com todos os educandos reunidos. Este ano, por exemplo, os temas mais votados foram “Meio Ambiente e Desastres Naturais” e “Saúde Pública”. A escolha do tema sempre é retirada em um processo de valorização da Democracia como valor, por isso cada agrupamento, período e ciclo elegem um tema depois de debaterem internamente e depois escolhem um representante para defendê-lo na Assembléia Geral perante todos os educandos. Buscamos fortalecer a autonomia dos educandos Jovens e Adultos nos temas que mais tem relação com a vivência deles, atraindo e ampliando o interesse pelos estudos.
Para saber mais do projeto recomendo a leitura do blog oficial e fique convidado a fazer uma visita. O CIEJA CL é uma escola pública da Prefeitura de São Paulo e como espaço público está sempre aberto a receber os cidadãos.
Atentamente,
Rubens Baldini Neto
http://blogdociejacampolimpo.blogspot.com/
ExcluirParabéns Rubens Baldini Neto! Muito bom ver pesquisadores Russinianos na EJA. Como é o processo de avaliação? Você também defende que o ensino de história deveria "desenvolver de uma consciência histórica crítica-genética", como seria isto se a tipologia da consciência em Russen não é hierárquica, é simultânea e inerente ao humano?
ResponderExcluirCláudio Correia de Oliveira Neto.
ExcluirMuito obrigado pela pergunta Cláudio C. de Oliveira Neto.
Os trabalhos de J. Rüssen nos ajudam a sistematizar o aprendizado histórico de maneira mais detalhado e preciso, no que tange sua pergunta sobre avaliação, creio que você mesmo apresentou o caminho assinalado por Rüssen. Isto é, a avaliação do processo de construção da “consciência histórica” não é algo hierarquizado e sim um processo dinâmico e constante, não é porque um educando atinge um nível de reflexão que poderíamos chamar de ”genética” ou “histórico-crítico” em determinado tema estudado que ele “atingiu” um nível de “consciência histórica” para sempre. Trabalhar com educação é sempre se surpreender com as variáveis do processo de aprendizagem, pois um senhor que em determinado momento consegue elaborar uma resposta muito complexa para a questão, por exemplo, da dificuldade de atendimento no SUS, fugindo de uma explicação com justificativas meramente “morais” e elabora um contexto diacrônico de explicação histórica relacionando a saúde pública desde o Império brasileiro do século XIX, passando pela Primeira República e a exclusão dos pobres e negros até chegar ao contexto da redemocratização e os complexos jogos de interesse e consensos da sociedade civil é o mesmo senhor que ao tratar da violência contra a mulher não consegue admitir se quer que seja um tema passível de estudo. Portanto, construir a empatia histórica também parece ser uma tarefa crucial e reiterado dos professores de história.
Portanto, como avaliamos no CIEJA CAMPO LIMPO? Construímos coletivamente uma metodologia de aprendizagem durante os 21 anos de experiência do Centro sempre tendo os ensinamentos de Paulo Freire e sua Pedagogia da Autonomia. Assim, aos educandos é apresentado os critérios de aprendizado que serão avaliados durante o mês que ficarão na área de Ciências Humanas, por exemplo “reconhecer as temporalidades de fenômenos sociais”, e a cada atividade que esta habilidade tem de ser mobilizada relembramos que para o prosseguimento dos estudos para o módulo seguinte ou para conclusão de todos os módulos, eles devem tentar atingir plenamente esta habilidade. No final de cada semestre sentamos com cada educando, a coordenadora pedagógica e os professores das quatro áreas de conhecimento e discutimos com ele se acredita ter atingido os objetivos específicos de cada área, dando oportunidade para que o educando possa argumentar como auto-reconhece seu processo educativo.
Desta forma, buscamos uma avaliação processual e colaborativa onde o próprio educando toma consciência daquilo que precisa melhorar e do quanto já avançou em seu aprendizado.
Espero ter ajudado com a reflexão.
Atentamente,
Rubens Baldini Neto
Muito obrigado pelo esclarecimento.
ExcluirMaravilhosa essa experiência do CIEJA CAMPO LIMPO, uma inspiração para todos que trabalham com EJA.
Cláudio Correia de Oliveira Neto.
Parabéns Rubens, meus sinceros parabéns pelo texto. Eu gostaria de saber sua opinião sobre "como lidar, ou saber se adequar à realidade dos estudantes do EJA? Pois, como sabemos a diversidade em sala de aula, e em especial em uma sala de adultos e muitas vezes de difícil familiaridade por parte do professor.
ResponderExcluirCarolina Lima Costa
Boa tarde Carolina Costa,
ExcluirSua pergunta talvez seja uma das mais instigantes para quem trabalha com EJA.
No CIEJA Campo Limpo nos debruçamos sobre ela semanalmente, mas ainda não conseguimos respostas definitivas e sim um caminho possível.
Hoje o EJA tem atendido cada vez mais Jovens de 15 à 18 anos de idade, sobretudo pelo processo de expulsão que ocorre nas Escolas Regulares dos chamados “alunos-problemas”. No CIEJA CL temos mais de 1700 educandos matriculados frequentes, destes por volta de 200 estão na condição de “Liberdade Assistida” e “menor infrator”, além dos 233 com alguma ou múltiplas necessidades especiais, e mais de 30 alon@s transsexuais que não conseguiram se matricular em escolas regulares por transfobia e o público histórico de EJA mulheres maduras, sua maioria negras e migrantes do Norte e Nordeste do Brasil, que não conseguiram concluir seus estudos na chamada “idade certa”. Assim, podemos afirmar que a diversidade convive no Centro, mas não é fácil conciliar os interesses de Jovens excluídos da Escola Regular, com idos@s e adultos trabalhadores que buscam no EJA uma melhoria de vida, inclusive com a “promessa” propaganda da “melhor inserção no mercado de trabalho”. Então como temos feito no CIEJA CAMPO LIMPO? Por experiência a resposta é sempre o ACOLHIMENTO. Este talvez seja nosso valor primordial, acolher, tanto é que o nome do primeiro agrupamento (o de educandos que necessitam de alfabetização) se chama ACOLHIMENTO. Acolher a diversidade, escutar suas demandas e suas experiências de vida e construir possibilidade de intercâmbio destas histórias é o que gera uma empatia crucial para o desenvolvimento pleno de todos os envolvidos no processo educativo, inclusive nos educadores, que aprendemos diariamente com pessoas de uma sabedoria exemplar como Dona Neide que diz “Não importa quem puxou o gatilho: retribua pelo bem”, e que do assassinato de seu filho único aos 18 anos de idade construiu uma escolinha de futebol para os meninos e meninas do bairro terem oportunidade para além do tráfico, ou de Zila que aos 55 anos de violência doméstica se liberta das amarras e preconceitos da sociedade e denuncia o marido e assume sua parceira diante da sociedade brasileira cada vez mais homofóbica.
É pela força da história de cada um e cada uma dos educandos do EJA que podemos superar as dificuldades, quando os jovens escutaram a voz embargada de Dona Neide contando sua história de vida deram outra atenção quando ela diz em sala “Meninos, prestem atenção, isto que o professor está falando é importante”.
Atentamente,
Rubens Baldini Neto