HISTÓRIA E ARTE: A GUERNICA E A SEGUNDA
GUERRA MUNDIAL
Introdução
A disciplina de História muitas vezes opera dentro da escola
isoladamente das outras unidades curriculares. O trabalho interdisciplinar,
bastante estudado, debatido e pouco praticado, dada as suas peculiaridades de
execução, pode ser ainda uma maneira interessante de se ter uma experiência
educacional prazerosa e significativa, tanto para estudantes como professores.
Com esse intuito, antes de iniciarmos o assunto Segunda Guerra Mundial pensamos
em uma atividade diferenciada, que fizesse os estudantes refletirem e se
manifestarem sobre esse tema, por meio da arte. Dessa vontade surgiu a ideia de
se trabalhar a famosa obra Guernica,
de Pablo Picasso, dentro do contexto histórico em que estava inserida e
relacioná-la mais diretamente com a Segunda Guerra Mundial.
A ideia foi levada a professora de Artes, Profa. Esp. Sheila
Schena, que prontamente se inseriu na proposta. Não se tratava de um projeto
interdisciplinar, defendido por Hernandes (1998, p. 61), como uma modalidade de
articulação dos conhecimentos escolares e uma forma de organizar a atividade de
ensino e aprendizagem, a partir de um tema problema, preferencialmente levantado
pela turma, mas de uma proposta que batizamos de “parceria pedagógica”. Esta
parceria, nesse momento, consistia em aproveitar as aulas de Artes e de História,
cada uma com suas especificidades, mas que mantinham por meio do diálogo
interdisciplinar, um fio condutor com conteúdos em comum: movimentos artísticos
do século XX e movimentos bélicos do século XX. Essa parceria pedagógica se deu
a partir de um objetivo: dar subsídios aos estudantes do nono ano a fazerem uma
releitura da obra Guernica de Pablo Picasso
com base nas informações debatidas em sala de aula a respeito da Segunda Guerra
Mundial e do movimento Cubista.
Uma questão, decidida entre professores e alunos foi como se
daria a produção dessa releitura. A primeira proposta foi fazer trabalhos em
equipes. Inicialmente essa idéia foi aceita, até que outra proposta foi colocada:
“E se fizermos uma releitura apenas?Em um papel maior?” O desafio aumentaria e
talvez o resultado fosse mais inusitado. Feito as propostas a segunda opção foi
escolhida por unanimidade. A partir dessa primeira etapa, foram estabelecidos
os objetivos específicos do trabalho:
- ·
Contextualizar a Guerra Civil Espanhola
como antecedente da Segunda Guerra Mundial;
- ·
Discutir as características,
ideologias, batalhas e consequências da Segunda Guerra Mundial;
- ·
Compreender o Cubismo como movimento
artístico do início do século XX, tendo como principal expoente Pablo Picasso,
autor de Guernica;
- ·
Perceber as características
monocromáticas da obra Guernica;
- ·
Desenvolver em equipes da releitura da
obra Guernica.
A Guerra Civil Espanhola e o bombardeio
de Guernica
A Espanha da década de 1930
passava por dificuldades econômicas decorrentes da Crise
de 1929 e de
disputas políticas internas. Em 1936, a Frente Popular, ligada ao Partido
Republicano e a grupos comunistas, socialistas e anarquistas, ganhou as
eleições. Por conta das repercussões da Revolução Russa, a vitória da Frente instalou
medo nos setores conservadores da sociedade espanhola, que viam a Frente como
uma ameaça de revolução socialista. Os conservadores estavam reunidos na Frente
Nacionalista, que tinha os generais Franco e Sanjurjo como líderes. Iniciou-se
uma guerra entre adeptos da Frente popular e da Frente Nacionalista. Diante das
tensões criadas com as mortes em ambos os lados, o golpe de Estado que vinha
sendo organizado pelos Nacionalistas foi antecipado e em 17 de julho setores do
Exército se declararam rebeldes e Franco, general do exército, assumiu a
liderança de tropas espanholas no Marrocos. O golpe fracassou, mas tinha início
a Guerra
Civil espanhola, que só terminaria em 1939 com a vitória dos
Nacionalistas e a instalação da ditadura franquista, que durou até a morte do general em 1975. (CARDOSO,
2017).
Na Europa da década de 1930, a
Guerra Civil espanhola não significava apenas disputa de poder entre espanhóis,
mas era também uma guerra ideológica. A Alemanha
nazista enviou parte de sua Força Aérea (Luftwaffe), a Legião
Condor. A Itália de Mussolini mandou cerca 50.000 homens para combater ao lado
dos Nacionalistas. Do outro lado, ainda que tenham recebido ajuda da União
Soviética, o grande
reforço às tropas republicanas veio da formação de grupos de voluntários em
diferentes lugares do mundo, juntando-se aos espanhóis e formando as chamadas
Brigadas Internacionais. Assim, a Guerra Civil espanhola é compreendida como um
prelúdio à Segunda
Guerra Mundial, pois as
potências nazi-fascistas aproveitaram-se do conflito para testar seu poder
bélico. Os mais famosos dos experimentos feitos pelos nazistas é o bombardeio e
destruição da cidade de Guernica, na Espanha. (Idem).
“O ataque foi realizado em um dia estratégico: todas as segundas-feiras, os agricultores da região se reuniam (e até hoje se reúnem) na praça principal para vender seus produtos. A vila recebia visitantes dos vilarejos vizinhos, interessados na feira. Nessas ocasiões, circulavam pelas ruas de Guernica 10 mil pessoas. Há controvérsias se o mercado foi realizado naquela data em específico, porque o governo local vinha restringindo as grandes concentrações de pessoas. Mas o fato é que quem escolheu a data conhecia a região e queria alcançar o maior número possível de civis”. (CORDEIRO, 2018).
Picasso e o Cubismo
O Cubismo foi um movimento artístico que teve
como seus principais expoentes e pioneiros Pablo
Picasso e Georges Braque, por volta
da primeira década do século XX. O Cubismo é considerado um dos movimentos mais
influentes desse período. Suas obras utilizavam desenhos geométricos para
retratar as formas da natureza. Desse modo, a representação do universo visual
passou a não ter nenhuma obrigação com suas reais formas. Por outro lado, as
obras não são abstratas, pois as imagens representadas ainda permaneciam
reconhecíveis. Além disso, as figuras eram representadas de diferentes ângulos
na mesma obra. Desse modo, ao olharem para uma cadeira, por exemplo, a
representavam na pintura, por diferentes ângulos: de cima, de baixo, de lado ou
de cabeça para baixo. Assim, esses artistas tentavam capturar todos esses
pontos de vistas num mesmo plano. Essa é a principal característica das pinturas
cubistas. (OLEQUES, 2017).
"Pablo Ruiz Picasso (1881-1973) nasceu em Málaga, Espanha, no dia 25 de outubro de 1881. Filho de José Ruiz Blasco um professor de História da Arte apaixonado por pintura, e de Maria Picasso y López, ainda menino, mostrou seu talento para as artes. Seus primeiros desenhos representavam touradas. Com 14 anos já pintava com modelos vivos. Em 1896 muda-se com sua família para Barcelona, onde seu pai alugou um estúdio para o filho. Nesse mesmo ano, sua tela “Primeira Comunhão” é aceita pela Exposição Municipal de Barcelona. O quadro “Dois Patos” é enviado pelo pai para uma exposição em Málaga, recebendo o primeiro prêmio oficial do pintor”. (E-BIOGRAFIAS, 2017)
Em 1906,
Pablo Picasso começou a trabalhar em “Le Demoiselles d’Avignon”, onde as formas
geométricas eliminam a profundidade espacial. Uma obra com diversas
influências, entre elas, a arte africana, ibérica e elementos de El Greco e
Cezanne, era o início de uma nova fase, e mm companhia do pintor Georges
Braques, deu início ao “Cubismo”, onde prevalecem os motivos totalmente
fragmentados. São dessa época: “Nu” (1910), “O Poeta” (1911), “O Aficionado” (1912)
e “Copos e Garrafas” (1913). A partir de 1915, Picasso abandona aos poucos o
rigor do Cubismo e entra na etapa figurativa. Vai para Roma e casa-se com a
bailarina Olga Khokhlova, muda seu modo de vida e faz opção pelo neoclássico,
pinta: ”O Retrato de Olga na Poltrona” (1917), “Pablo Vestido de Arlequim”
(1924), entre outras. (E-BIOGRAFIAS, 2017).
Em 1937
durante a Guerra Civil Espanhola, aviões alemães bombardeiam a cidade basca de
Guernica. Poucas semanas depois, Picasso começa a pintar o enorme mural em
estilo impressionista “Guernica”. Foram dois meses de trabalho, onde ele
expressa a violência e a crueldade do bombardeio usando imagens como o touro, o
cavalo, o guerreiro caído, a mãe com seu filho morto e uma mulher presa em seu
prédio em chamas. A obra foi exibida no pavilhão espanhol, na Exposição
Internacional de Paris. A pintura permaneceu no Museu de Arte Moderna de Paris
de 1939 a 1981, quando foi levada para a Espanha. Encontra-se exposta no Museu
Nacional de Arte Rainha Sofia, em Madri. (IDEM).
Figura 1: Guernica
Fonte: OLEQUES,
Liane Carvalho. Guernica. Disponível
em: < http://www.infoescola.com/artes/guernica/>
Acesso: 09 mar. 2017.
Guernica é talvez a obra mais
emblemática da carreira de Pablo Picasso e da arte do século XX. Medindo 349,3cm x 776,6cm a obra
mostra os horrores do bombardeio à cidade basca de Guernica em 26 de Abril de
1937. Durante a Segundo
Guerra Mundial a cidade ficou em
chamas após sucessivos ataques por aviões da força aérea alemã e Picasso, mesmo
morando em Paris nessa época, não se calou diante do ocorrido depositando na
tela todo seu pesar. A tela está exposta no Museu Nacional Centro de Arte Reina
Sofia, em Madri, Espanha.
A atividade
Depois de
estarem contextualizados sobre a Guerra Civil Espanhola, sobre o bombardeio da
cidade de Guernica, sobre a Segunda Guerra Mundial e sobre Pablo Picasso e o
movimento Cubista, os estudantes foram desafiados a pintarem a suas obras: uma
releitura de Guernica com referências
a Segunda Guerra Mundial. Primeiramente em pequenas equipes de dois e três
estudantes fizeram os desenhos em folha de papel A4. A ideia era fazer estudos
e depois transpassá-los para a obra. Nessa etapa os alunos trabalharam em sala
de aula, nas aulas de História e Artes.
Como a
confecção da Guernica exigia um local
apropriado para se trabalhar, materiais de artes e, além disso, geraria
movimento na escola, optamos em conversar com os professores que teriam aula no
dia em que os alunos estivessem realizando o trabalho e pedimos que cedessem
suas aulas, para que todo o trabalho fosse feito em apenas um período.
Figura 2: Processo criativo da turma 91
Fonte: Acervo do autor
A união do
grupo de professores foi um facilitador do processo. Por conta disso, os alunos
naquele dia estavam com cem por cento do tempo dedicados a confecção de suas “Guernicas”.
A exigência era de que eles só podiam usar as cores preta, branca e cinza. O
local mais adequado para o desenvolvimento do trabalho foi o pátio coberto. Nas
mesas do refeitório os alunos puderam se debruçar sobre o trabalho, e também tinham
acesso fácil à água, já que o trabalho envolveu tintas e
pincéis. As obras foram confeccionadas sobre papel craft (pardo).
Figura 3: Processo criativo da turma 92
Fonte: Acervo do autor
Considerações Finais
Não existe
satisfação maior para o professor do que perceber que seu trabalho está fazendo
a diferença na vida de seus alunos, e foi este o sentimento dos professores de
Artes e de História da Escola de Educação Básica Pedro Ivo Figueiredo de
Campos, ao final desse trabalho, nomeado como uma “parceria pedagógica”. O
trabalho foi um sucesso, de aprendizado e de satisfação entre alunos e
professores.
A turma 91
concentrou-se em explorar os efeitos nefastos da Segunda Guerra Mundial por
meio da figura central da obra que é a explosão da bomba atômica. Além disso os
alunos optaram em fazer referências à queima de livros de cunho judaico e
comunista imposto pelos nazistas e também bombardeios e a radioatividade
decorrente do uso das armas atômicas.
Figura 4: Releitura
da Guernica turma 91
Fonte:
Acervo do autor
Na turma
92 as referências usadas foram a figura de Adolf Hitler, a queima de livros proibidos
e os bombardeios. Além disso, os alunos abordaram a destruição das cidades
representada pelo prédio destruído, os símbolos da guerra como o arame farpado,
suástica e o símbolo de anticomunismo.
Figura 5:
Releitura da Guernica turma 92
Fonte:
Acervo do autor
Os alunos
da turma 92 (vespertino) não tiveram acesso ao trabalho da turma 91 para que
não fossem influenciados. Dessa maneira, o resultado foi duas releituras
bastante diferentes. As obras ficaram expostas na escola por duas semanas e
foram guardadas. Foram expostas novamente no dia da festa da família na escola
que ocorreu em dezembro de 2016
Referências
Jackson
Alexsandro Peres é doutor em História pela UFSC e Professor da Faculdade
Municipal de Palhoça - SC e da Rede Estadual de Ensino de SC.
CARDOSO,
Luisa Rita. A Guerra Civil Espanhola.
Disponível em: <http://www.infoescola.com/historia/guerra-civil-espanhola/>
Acesso: 22 fev. 2017.
Auler,
Octávio. O massacre de Guernica : arte e história. Disponível em: <http://maishistoria.com.br/massacre-guernica-arte-historia/>
Acesso: 22 fev. 2017.
HERNANDEZ,
Fernando. A organização do currículo por
projetos de trabalho. Tradução Jussara Haubert Rodrigues. 5 ed. Porto
Alegre: Artmed, 1998.
OLEQUES, Liane Carvalho. Cubismo. Disponível em: < http://www.infoescola.com/artes/cubismo/>
Acesso: 09 mar. 2017.
OLEQUES, Liane Carvalho. Guernica. Disponível em: < http://www.infoescola.com/artes/guernica/>
Acesso: 09 mar. 2017.
PICASSO, Pablo. Disponível em: < https://www.ebiografia.com/pablo_picasso/>
Acesso: 09 mar. 2017
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ResponderExcluirOlá Jackson Alexsandro Peres.
ResponderExcluirParabéns pelo tema abordado em seu trabalho.
Uma questão oriunda da leitura do seu texto foi se poderíamos criar um percurso sobre cidades ícones da Segunda Guerra Mundial, abordando aquelas que foram bombardeadas. Seria viável realizar um percurso iniciando por Guernica (Espanha), seguindo para Dresden (Alemanha) e concluindo com Hiroshima e Nagasaki (Japão) para fomentar uma discussão sobre as cidades e a guerra, a formação de ícones urbanos, as reconstruções, as releituras. Enfim, fomentar uma reflexão sobre a Segunda Guerra Mundial seguindo este roteiro que está no momento momento inicial, no desenvolvimento do conflito e no seu momento final.
Atenciosamente, Fabian Filatow.
Boa noite Fabian. Obrigado pela leitura. Penso que a ideia é muito interessante e viável. Claro que demandaria mais tempo e outros estudos. Vamos nos comunicando. Abraço
ExcluirJackson Alexsandro Peres
Boa tarde a todos.
ResponderExcluirÉ tão bom, reconfortante e especial ver os alunos aprendendo, animados com o conteúdo e participando. Por isso, meus parabéns a essa iniciativa que tanto soma para o saber.
Podemos ver que tanto os professores quanto os alunos abraçaram muito bem a ideia, mas e a escola, como recebeu essa proposta?
Abraços,
Ana Clara Fernandes da Costa
Boa noite Ana Clara. A escola super apoiou. Tenho tido apoio sempre em diferentes momentos e projetos. Do contrário seria difícil inovar na prática docente. Obrigado pela leitura.
ExcluirJackson Alexsandro Peres
Boa noite Ana Clara. A escola super apoiou. Tenho tido apoio sempre em diferentes momentos e projetos. Do contrário seria difícil inovar na prática docente. Obrigado pela leitura.
ResponderExcluirJackson Alexsandro Peres